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Referências do Universo Marvel nas Relações Internacionais

Atualizado: 22 de dez. de 2021



Nada melhor do que aproveitar o restinho das férias para maratonar nossas séries e filmes favoritos, não é mesmo? Os filmes do Universo Cinematográfico Marvel, pelo enredo de super heróis e vilões, mostram muitos detalhes e situações que, indiretamente, podemos vivenciar, e além de uma distração, eles também podem nos auxiliar a entender alguns conceitos e teorias do campo de Relações Internacionais.

Para dar início às relações possíveis, logo no início do filme Capitão América: o Soldado Invernal (2014), Nick Fury diz a Steve Rogers que “A SHIELD vê o mundo como ele é, não como gostaríamos que fosse”. Tal fala tem semelhança direta com a teoria Realista de Morgenthau e Edward H. Carr que expõe o sistema internacional como anárquico e os principais atores - Estados - como sedentos pelo poder na busca pela sobrevivência e seus interesses nacionais. Logo, Fury enxerga o mundo, as pessoas e as relações da forma como elas são, e não como elas deveriam ser, assim como na obra Vinte anos de Crise, na qual Carr expõe que o realista aceita os fatos abstendo-se da possibilidade de mudança, enquanto o idealista nega a possibilidade de compreender o mundo que tenta alterar.

Já em Capitão América: Guerra Civil (2016), com o aumento da preocupação da comunidade internacional após o desastre em Sokovia e acidentes envolvendo a morte de civis na tentativa de evitar o roubo de armas biológicas em Lagos, na Nigéria, começaram a ser negociados documentos legais que regulassem a atividade de indivíduos aprimorados, sejam aqueles que trabalhassem para organizações governamentais como a SHIELD, ou organizações privadas. Nesse contexto, o secretário de Estado norte-americano Thaddeus Ross em uma reunião com alguns dos Vingadores apresenta o Acordo de Sokovia que objetivava que os Vingadores deixassem de ser uma organização privada para atuarem por meio da ONU. Ross dizia “Nos últimos 4 anos, vocês [os Vingadores] operaram com poder ilimitado e sem supervisão. É um formato que os governos do mundo todo não podem mais tolerar”. Tal frase tem ligação com as teorias tradicionais de securitização, as quais estabelecem o Estado como detentor legítimo do uso da força e que deve ter sua soberania respeitada, ao mesmo tempo em que focam as análises em questões interestatais e capacidades materiais. Assim, é possível relacionar com a teoria liberal de segurança em que não se nega a importância e o papel do Estado, mas enfatiza-se a importância dos atores não estatais na busca pela paz internacional, principalmente as instituições que por meio da participação de demais atores e pela cooperação possibilitam a segurança e a paz no sistema.

Ainda em Capitão América: Guerra Civil, Steve Rogers, ao discutir sobre o Acordo com os demais membros do grupo, diz que “Organismos internacionais são liderados por pessoas com ideais, e eles mudam”. Esse posicionamento pode ser observado na teoria construtivista de Wendt, na qual estabelece-se que os seres humanos, o próprio sistema internacional e suas organizações são atores que possuem propósitos - vontades - e suas ações ajudam a reproduzir ou transformar a sociedade na qual eles vivem. Assim, o construtivismo na fala de Rogers admite a sociedade como feita por relações sociais que estruturam as interações entre os atores e seus propósitos, logo, considerando os agentes humanos e as estruturas sociais como interdependentes ou entidades de implicações mútuas.

Além disso, em Pantera Negra (2018), T’Challa ao discutir com Killmonger sobre a possibilidade de armar grupos oprimidos diz “Nossas armas não serão usadas para travar guerras no mundo, não cabe a nós arbitrar, julgar e decidir sobre o destino de um povo além do nosso”. Tal discurso remete à teoria neorrealista defensiva de Waltz, na medida em que considera-se a importância das capacidades materiais como um meio, mas não como um fim. Nessa postura, T’Challa reconhece que o mundo tem seus problemas e pode ser violento, por essa razão Wakanda era isolada das demais nações e ao mesmo tempo buscava o desenvolvimento de sua tecnologia e defesa. Assim, como proposto por Waltz, o potencial militar é direcionado para a defensão, ao passo que os Estados se concentram em manter o equilíbrio de poder e até mesmo cooperar evitando competições diretas no sistema internacional que é anárquico propício à guerras.

Por fim, na série Loki (2021), quando Loki e Sylvie estão em Lamentis em busca de informações para conseguirem fugir do planeta, Sylvie tenta arrombar a porta de um trailer e logo em seguida Loki diz que a “força bruta não substitui diplomacia e astúcia" e tenta conversar com a senhora que estava lá dentro. Tal posicionamento reflete ideias da teoria liberal de Wilson e Angell em Relações Internacionais, na qual tem-se o Estado como ator racional que vê a anarquia internacional, mas que ao mesmo tempo acredita que é capaz de garantir seus interesses por meio da diplomacia e da cooperação. Nesse contexto, aponta-se a busca pelos interesses sem a necessidade de recorrer às capacidades militares, diminuindo então organizações de defesa na medida em que se desaparece a possibilidade de agressão.



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