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O Plano Real e a "dependência desejada"

Como dito por Belluzzo e Almeida, o Plano Real representou a entrada de um novo modelo de desenvolvimento na economia brasileira, cujo fundamento era o binômio abertura e competitividade. Esse modelo é imaginado no contexto de uma nova fase do capitalismo — a de prevalência das políticas e da ideologia neoliberal — em que os investimentos produtivos e a manutenção de baixos níveis de desemprego deixam de ser os elementos mais importantes para a reprodução do sistema, que se tornam a conquista da confiança do mercado para garantir a entrada de seus investimentos no país. Nesse momento da história do capitalismo, o que prevalece é aquilo que Paul Singer chamou de “dependência desejada”: uma nova forma de ser do capitalismo dependente que se espalha por todo o globo. Essa dependência é dada, em conjunto com a antiga dependência dos países “atrasados” aos do “centro”, em uma dependência de todas as economias aos interesses e aos anseios do capital privado globalizado. Nesse contexto, alguns elementos do Plano Real chamam a atenção, já que, apesar de alcançar a meta de controlar a inflação, o plano contribuiu para o aumento da instabilidade macroeconômica do país.

O primeiro desses elementos, e talvez o mais importante, foi a âncora cambial. Necessitando criar uma nova moeda que não possuísse memória inflacionária, o Plano Real implementou uma significativa valorização do real que, além de reforçar a credibilidade da economia brasileira, também possibilitou um boom de importações que impediu um aumento dos preços dos produtos. Por outro lado, esse fundamento do Plano Real levou a uma drástica redução da lucratividade do setor exportador do país e à deterioração dos setores produtivos da economia brasileira, o que levou ao aumento do desemprego e à queda da renda das famílias.

O segundo elemento era os juros altíssimos implementados para atrair os investidores com uma garantia de grandes rendimentos em dólares. Isso revela uma nova situação a ser encarada pela economia brasileira, pois, diferente do passado quando as reservas em divisas do país possibilitaram por si próprias a valorização da moeda nacional, agora para a manutenção da âncora cambial era necessário garantir a todo o momento as condições ideias de lucratividade dos investidores. Caso contrário, o capital que entrou rápido no país passaria a sair rápido, assim comprometendo a continuidade do Plano Real.

O último elemento do Plano Real que contribuiu para o aumento da instabilidade macroeconômica do país a ser analisado foi a política de austeridade fiscal. Essa, por sua vez, possuía dois fundamentos: a redução dos gastos do governo para mostrar os investidores privados o compromisso do país com a responsabilidade fiscal e a manutenção da competitividade da economia brasileira; e as privatizações, que além de serem do interesse do mercado também cumpriam o papel de adquirir moedas estrangeiras e limitar o crescimento da dívida pública, assim garantindo a reprodução do Plano Real.

A Âncora cambial, os juros altos e a política de austeridade fiscal contribuíram para aprofundar o caráter dependente da economia brasileira e criaram problemas estruturais que persistem até os dias de hoje. O aumento da concentração de renda dos grupos mais ricos do país, o enfraquecimento do poder de barganha dos trabalhadores, a acentuação do “curto prazismo” das políticas econômicas, a maior dependência em relação às economias dos chamados países desenvolvidos e a deterioração dos setores produtivos da economia brasileira foram os principais legados do Plano Real para o Brasil.


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