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MODERNIDADE E TEMPO:A REVOLUÇÃO BOLIVIANA (1952) À LUZ DATEORIA DE DESENVOLVIMENTO IGUAL E COMBINADO

Por Rebeca Rabêlo


O conceito de modernidade na ordem internacional traduz a narrativa do progresso, da emancipação que permite à humanidade uma nova forma de desenvolvimento, trazendo revoluções e rupturas por meio do antagonismo entre correntes de pensamentos, classes sociais e interesses contraditórios. Mas a ideia de progresso pode ser também substituída para uma noção de crise, que para a história é entendida como um avanço gradual ou repentino. As crises trazem consigo também uma nova lógica da modernidade, pois de acordo com Rafaela

Pannaim (2018), durante graves crises políticas, há uma ruptura nas rotinas, nas temporalidades do setor institucional, assim, as grandes crises políticas correspondem a mobilizações multissetoriais.

De acordo com Danilo Porfírio (2018) a modernidade é a retórica do capitalismo, em que por meio do trabalho se alcança o desenvolvimento, seja do indivíduo ou do país. Para Trotsky (2000)[1], qualquer país está pronto para uma revolução, pois os setores oprimidos precisam transformar a sociedade para sobreviver. A revolução boliviana (1952) foi um importante marco na história do trotskismo — é uma revelação que nasceu da necessidade de nacionalização dos recursos naturais e da exploração do estanho, já que os insumos deveriam ser reinvestidos para o desenvolvimento da nação (ANDRADE, CARI, 2020).

O Estado boliviano é complexo, possui grandes histórias relacionadas a conflitos político-sociais, a etnicidade de seu povo, as relações de forças entre proletário, campesinos, governos e militares, que foram elementos catalisadores de revoltas que impulsionaram mudanças necessárias em determinados períodos. Porém, de acordo com Luiz B. Pericás (1997) o projeto de modernização econômica da Bolívia nunca ocorreu. A teoria do desenvolvimento desigual e combinado tenta explicar a diferença entre os países com capitalismo periférico ou dominados pelo colonialismo e pelo imperialismo (LOWY, 1995, p.73). Tal afirmação é bem exemplificada por Ramon Blanco e Ana C. Delgado (2019), pois no colonialismo é negado ao Outro o direito à contemporaneidade, o Outro nunca existe no mesmo tempo que o Eu/Nós. O Outro está sempre atrasado, nunca presente no mesmo futuro, o Outro nesse caso seriam os países em desenvolvimento, estes países estão sempre tentando alcançar a emancipação, mas nunca a conseguem de fato.

Na década de 1930, a Bolívia era um país considerado atrasado do ponto de vista da civilização, apesar de estar conectada às grandes empresas internacionais por conta da exportação de estanho fornecido principalmente para Londres. Em 1932, aconteceu a Guerra do Chaco que resultou na morte de mais de mil homens e na derrota boliviana para o Paraguai. O período foi caracterizado também como uma época de movimentos nacionalistas e avanços das lutas sociais populares de camponeses e operários.

Já nos anos 1940 houve as novas organizações políticas, como o surgimento do Partido Obrero Revolucionário (POR), o primeiro congresso indígena em 1945, o sindicalismo mineiro e a tese de Pulacayo que tinha suas ideias baseadas na teoria da Revolução permanente de Trotsky (PERICÁS,1997, p.112). Entre 9 e 11 de abril de 1952 aconteceu a revolução boliviana que por vezes tinha uma linha “democrático-burguesa” e uma linha “nacional popular” (PERICÁS, 1997), apesar desses dois grupos não terem os mesmos objetivos, ambos compartilhavam a necessidade de retirar as elites do poder. A ala esquerda da revolução — os Trotskistas do Partido Obrero Revolucionário — buscavam fortalecer a perspectiva operária socialista, um projeto popular contra a submissão da Bolívia.

Assim a fundação da COB passou a governar juntamente com o Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR), que indicaram 9 ministros. Ao propor esse “co-governo” o MNR tentou impedir uma radicalização da revolução, e apoiado pelos Estados Unidos o MNR passou a defender um discurso nacionalista e retomou o exército boliviano. Em 1964 a COB afastou-se do MNR e o exército fez um pacto com os camponeses e assim uma revolução anti-imperialista de 1952 foi interrompida, “enfraquecendo as vias operárias-socialista “(Everaldo, CARI, 2020). Segundo Lowy (1995), uma das características do desenvolvimento desigual e combinado é o atraso dos países periféricos a uma transformação, visto que estes sofrem com a interferência dos países já desenvolvidos, como é o caso boliviano. A Bolívia, não teve um desenvolvimento linear, passou por tentativas de desestabilização política, foi lotada de descontinuidades e inovações que expõem parte da complexidade que faz da América Latina um lugar tão dinâmico e único no que tange às suas formações políticas, econômicas e sociais. As principais ideias de Trotsky foram reunidas em um compilado, em que as principais fundamentações foram retiradas de Lowy em A teoria do desenvolvimento igual e combinado, 1998.


Rebeca Rabêlo é internacionalista por formação e jornalista de dados por profissão. Pesquisa sobre mídia, ideologia e política externa. Instagram: @_rbcar_



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


BLANCO, Ramon and DELGADO, Ana Carolina Teixeira. Problematising the Ultimate Other of Modernity: the Crystallisation of Coloniality in International Politics. Contexto int. [online]. 2019, vol.41, n.3, pp.599-619. Epub Dec 02, 2019. ISSN 1982-0240. https://doi.org/10.1590/s0102-8529.2019410300006.


DUSSEL, Enrique. Europa, modernidad y eurocentrismo. In: LA colonialidad del saber: eurocentrismo y ciencias sociales: Perspectivas Latinoamericanas.


Buenos Aires y Caracas: UNESCO y CLACSO, 2000. cap. 1, p. 145-159. Disponível em: https://www.tni.org/files/download/La%20colonialidad%20del%20saber.%20Eurocentrismo%20y%20ciencias%20sociales.pdf. Acesso em: 14 out. 2020. LÖWY, Michael. “A teoria do desenvolvimento desigual e combinado” in Outubro, n. 1,1995, p. 73-80.


MINICURSO REVOLUÇÕES E CONTRA REVOLUÇÕES NO SUL GLOBAL, CARI, 2020, São Paulo. Everaldo de Oliveira Andrade - A revolução Cubana, mexicana e boliviana e seu impacto na América Latina [...]. CARI PUC - SP, 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=acPCMvzNyEE&t=9799s. Acesso em: 29 set. 2020.


PERICÁS, Luiz Bernado. Processo e desenvolvimento da revolução boliviana. Lutas Sociais, São Paulo, v. n.3, n. n.3, p. 5-177, 1997. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/ls/issue/view/1212. Acesso em: 12 out. 2020.


PANNAIN, Rafaela N. A RECONFIGURAÇÃO DA POLÍTICA BOLIVIANA:R ECONSTITUIÇÃO DE UM CICLO DE CRISES. Lua Nova [online]. 2018, n.105, pp.287-313. ISSN 1807-0175. https://doi.org/10.1590/0102-287313/105.


VIEIRA, Danilo Porfírio de Castro. Cosmopolitismo político e jurídico como discurso universalista moderno: Da modernidade como mundo da vida: a construção de um imaginário. In: A política externa norte-americana no oriente médio e o jihadismo. 1. ed.. ed. Curitiba: Appris Ltda, 2019. cap. 1, p. 33 - 79. ISBN 978-85-473-2448-3.



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