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A Guerra Comercial China X EUA

Atualizado: 13 de abr. de 2021


“Paz impossível, guerra improvável”, a célebre frase que ilustra a Guerra Fria do século passado reverbera neste com outras implicações. Apesar de parecerem distintas, as novas disputas têm, em última instância, um mesmo fim: poder. Seja ele econômico, militar, cultural, seja ele soft, hard, whatever ­– poder para ser um influenciador no cenário internacional.

Quando o pódio é dominado por poucos, quem está acima nunca cederá facilmente a trocas de posição. Não basta uma interdependência complexa entre os Estados para que as disputas não tomem lugar em um sistema sem unidade global.

Assim, o crescimento chinês torna-se um incômodo a partir do momento em que põe em risco a hegemonia estadunidense.

A ordem estabelecida, por mais desorganizada que seja, há de ser mantida para atender aos interesses de quem a lidera. Qualquer tentativa de transposição da linha é e será vista com maus olhos, talvez com retaliações.

Como afirmou Tucídides em V a.C., a ameaça que a evolução ateniense representava a Esparta foi responsável por iniciar a Guerra do Peloponeso. A ascensão de um país gera insegurança aos outros na medida em que ele se projeta como potência em um sistema que não permite muitos vencedores.

Pouco a pouco, a potência em ascensão invade esferas até então tidas como exclusivas da potência estabelecida. O objetivo de eterno crescimento e, consequentemente, de acumulação de poder faz com que Pequim ameace cada vez mais Washington com sua expansão mundial.

Se a China entrou com relutância nas organizações multilaterais, como uma imposição ocidental primeiramente, hoje ela desfruta de uma posição confortável no jogo do qual antes não fora signatária. Com altas taxas de crescimento, desenvolve-se a ponto de ser uma credora mundial e tem grandes projetos para todo o globo, a exemplo da Nova Rota da Seda.

A projeção chinesa em direção ao Oeste não é somente uma estratégia econômica do país que está prestes a ter o maior PIB do mundo, é uma estratégia de política internacional. Dessa forma, a China conquista mais influência e voz em decisões que passam pelos grandes líderes, rumo a uma readequação da ordem mundial ocidentalizada.

Essa ascensão é justamente o que preocupa os Estados Unidos. Uma ameaça à liderança do sistema econômico e de poder interventor em questões internacionais.

É nesse cenário que as medidas implementadas por Donald Trump e rebatidas por Xi Jinping ganham espaço. Uma nova guerra. Dessa vez, ou, por enquanto, sem armas. Os embates começaram no âmbito comercial a partir da elevação de taxas alfandegárias, disputas tecnológicas, passando por fechamento de consulados e proibição de uso de aplicativos.

Trump, como promessa de campanha para estimular a produção interna, elevou as tarifas de importação de produtos chineses, dificultando a entrada em seu país. Pequim retaliou de maneira igual. Após uma nova rodada de aumentos, Xi Jinping suspendeu a compra de produtos agrícolas americanos, além de ter sido acusado de desvalorizar a moeda — iuan — para baratear seus produtos frente ao mercado e deixá-los ainda competitivos, o que prejudicou as exportações dos Estados Unidos.

Apesar de acordos serem negociados e renegociados, a tensão entre os dois países continua. O ano de 2020 trouxe alguns episódios que deixaram claro que essa disputa está longe do fim. A forma como a pandemia do coronavírus foi abordada pelos países, com fortes acusações sobre a origem do vírus e a comunicação de dados, é um exemplo disso.

Washington decretou o fechamento do consulado chinês em Houston, Texas e, reciprocamente, Pequim fechou o consulado americano de Chengdu, Sichuan. Um retrato das relações diplomáticas fragilizadas.

Em meio a diversas acusações, o presidente estadunidense e outros importantes funcionários acusam a China de espionagem e roubo de propriedade intelectual. Ademais, aplicativos chineses como TikTok e WeChat chegaram a ser proibidos por representarem uma “ameaça à segurança nacional” dos Estados Unidos.

Além de acusações e proibições, a tecnologia deve permanecer como epicentro das notícias nos próximos anos, uma vez que a disputa pelo 5G também virou uma disputa geopolítica. Quem será o grande fornecedor mundial? Embargos serão feitos a países que usarem a tecnologia de um ou de outro? Qual a segurança e proteção do uso de dados?

Os conflitos deixam de contar com armamentos para dar lugar ao poder de influência, para disputar o topo da ordem econômica, cultural e ideológica nas próximas décadas. E, se tudo vale na arena de disputas, a questão que fica é: a que ponto essa guerra pode chegar?


Referências

SARFATI, Gilberto. Teorias de Relações Internacionais, 2005.

STUENKEL, Oliver. O mundo pós-ocidental, 2018.

KISSINGER, Henry. Ordem Mundial, 2014.

TREVIZAN, Karina. Guerra comercial: entenda as tensões entre China e EUA e as incertezas para a economia mundial. G1, 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2019/08/16/guerra-comercial-entenda-a-piora-das-tensoes-entre-china-e-eua-e-as-incertezas-para-a-economia-mundial.ghtml. Acesso em: 14 jan. 2021.

DYNIEWICZ, Luciana. Crise EUA x China aumenta incerteza na economia global. UOL Economia. Disponível em: https://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2020/06/22/crise-eua-x-china-aumenta-incerteza-na-economia-global.htm. Acesso em: 14 jan. 2021.


Escrito por Guilherme Caruso (guivcg@gmail.com)


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