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31 de Março: o dia do golpe militar no Brasil

Há 58 anos o Brasil sofria um golpe de Estado (1) que viria a se tornar uma ditadura empresarial-civil-militar. Chamamos assim por se tratar de um regime apoiado financeira e socialmente por empresários, com apoio da classe média brasileira e governado pelas forças armadas do país.

A ditadura no Brasil é, até hoje, um período obscuro da história, com documentos não revelados, registros apagados e uma política de puro esquecimento sobre os mais de vinte anos de perseguição política, vigilância social e reformas econômicas que visavam introduzir o Brasil no caminho do neoliberalismo (2) e afastar a influência comunista existente durante o século XX.

Talvez por esse apagamento, a classe política do país faça afirmações diversas sobre os “bons tempos” do regime sem se envolver em grandes problemas. Possivelmente por isso, também, a população brasileira não dá a devida importância aos acontecimentos do período de 1964 até 1989. E, quem sabe, seja essa a razão de não encontrarmos nenhuma placa, indício ou política pública focada em afirmar para a sociedade no Brasil que a ditadura aconteceu, foi brutal e cometeu violações diversas aos direitos humanos e também corrupções em diversas áreas da administração pública.

O caminho para a redemocratização no Brasil não foi simples: diversos setores sociais precisaram se articular das mais variadas formas: guerrilhas urbanas e rurais; oposição política legal (MDB); oposição política clandestina (PCB); movimentos de mulheres; movimentos pela anistia; movimento de estudantes, camponeses, negros, operários; articulações entre indígenas de diferentes etnias e denúncias feitas pelas Igrejas influenciadas pela Teologia da Libertação (3). Além disso, os artistas e intelectuais brasileiros se mobilizaram grandemente, utilizando seu espaço na mídia para denunciar os desaparecimentos forçados, a censura e o exílio.

Toda essa articulação política não foi em vão, porque em 1988 (depois de anos de protestos com milhares de pessoas exigindo a volta das eleições diretas, no famoso “Diretas Já!”, a Constituição Cidadã da República brasileira foi promulgada, trazendo esperanças que até hoje não foram totalmente sanadas, tais como: o direito à moradia; distribuição de renda; reconhecimento da autoridade e proteção aos povos originários; garantia de defesa universal dos direitos humanos, entre outros

A constituinte construída na década de 1980, procurou oferecer ao futuro ares de direitos políticos e liberdade. No entanto, o Estado brasileiro está longe de promover a reparação devida às vítimas da ditadura e está mais longe ainda de desenvolver políticas estruturadas no âmbito da memória, um pilar fundamental para a afirmação da democracia no país.

Relembrar o dia 31 de março como a data do golpe que levou os militares ao poder, portanto, é também uma forma de compreendermos que o sistema democrático no Brasil é jovem e tem enormes falhas, mas foi construído através da luta de cidadãos e cidadãs comprometidos com a liberdade e a responsabilidade política intrínseca a cada um de nós.


(1) Na segunda metade do século XX, com o estabelecimento da Guerra Fria, o mundo dividia-se em pólos opostos no espectro político-econômico: socialismo e capitalismo, que disputavam zonas de influência geopolítica. Os golpes militares na América Latina foram articulados pelo governo dos Estados Unidos, que procurava afastar a influência comunista nos países latino-americanos, principalmente após a vitória da Revolução Cubana em 1959. Para mais informações ver: https://library.brown.edu/create/openingthearchives/pt/?lang=pt

(2) Neoliberalismo é uma doutrina social e econômica, que prega a mínima intervenção do Estado na economia, acreditando que o mercado regula-se de acordo com as demandas sociais surgidas. O neoliberalismo é fundamentado em ideias de igualdade jurídica, livre iniciativa econômica e proteção à propriedade privada.

(3) A Teologia da Libertação é uma corrente cristã, nascida na América Latina durante a década de 1960. Essa teologia entende que os ensinamentos de Jesus priorizavam os pobres e seu contexto social, advogando também pelo uso das Ciências Humanas e Sociais para o entendimento do Evangelho e da prática cristã.


Referências:

FICO, Carlos. O golpe de 1964: momentos decisivos. São Paulo: FGV, 2014.

REIS, Daniel Aarão. A ditadura que mudou o Brasil: 50 anos do golpe de 1964. São Paulo: ZAHAR, 2014.

REIS, Daniel Aarão. Modernização, ditadura e democracia (1964-2010). São Paulo: Objetiva, 2014.

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